por Dr. Alexandro Assis Carvalho (OAB/SC 10.911)
O presente artigo trata de questionamento da eficácia garantia real de hipoteca, tendo por argumento os fatos ocorridos nos Estados Unidos da América, que determinaram uma crise econômica de proporções mundiais em decorrência da chamada “bolha imobiliária” e da falta de liquidez dos créditos imobiliários concedidos pelo sistema financeiro daquele País.
A hipoteca é a “espécie típica de direito real de garantia cujo objeto é um bem imóvel ou bens equiparados a imóveis” (apostila p.78), sendo até 1997 com edição da Lei 9.514/97 que introduziu no nosso sistema legislativo a alienação fiduciária sobre bens imóveis, a mais conhecida e utilizada forma de garantia real sobre imóvel para lastrear contratos de financiamento de imóveis e dívidas que se pretendiam garantir com imóveis.
O instituto da Hipoteca apesar de ser um instituto tradicional no direito brasileiro, tem se aperfeiçoado e acompanhado a evolução do direito nacional, com melhores aplicações lapidadas pela jurisprudência e pela influência da doutrina se lapidado no decorre do tempo, ao contrário de direito reais em garantia como a efiteuse, que despareceu de nosso ordenamento e a anticrese, quase em desuso.
Todavia, mesmo o rejuvenescimento e atualização do instituto não o tornam tão efetivo quanto o novel instituto da alienação fiduciária sobre imóvel, e a explicação está no fato de que no instituto da alienação fiduciária, o credor fiduciário de plano é elevado a condição de proprietário resolúvel do imóvel e possuidor direto, enquanto no instituto da hipoteca o credor não detém este direito direto real de propriedade em nenhum grau (resolúvel, nu-propriedade ou plena) e a propriedade com se sabe é o mais típico direito real.
Creio ser, esta, a grande vantagem do instituto da alienação fiduciária sobre imóvel em relação a hipoteca, decorrendo desta situação os demais aspectos que tornam a alienação fiduciária mais eficaz que a hipoteca.
A eficiência da alienação fiduciária sobre imóvel está primeiramente no fato de que no momento de sua constituição, o credor já passa a ter direitos de propriedade sobre o imóvel e na hipoteca estes direitos permanecem integralmente com o devedor, que inclusive poderá alienar o imóvel, ofertá-lo em garantia, ficando ainda o bem sujeito a penhora por dívidas do devedor, já na alienação fiduciária nada disso é possível já que o bem gravado em garantia não é de propriedade do devedor.
Quanto à forma de constituição da garantia e os sujeitos capazes de constituí-las não há distinção que dê vantagem a qualquer dos institutos, já que ambos podem ser constituídos por pessoas físicas ou jurídicas e por instrumentos públicos ou particulares.
Por sua vez, na execução da garantia a eficácia do instituto da alienação fiduciária disciplinado pela Lei 9.514/97, se mostra superior, pois o novel instituto, aperfeiçoando a execução extrajudicial de dívidas hipotecárias, dispostos nos artigos 30, parte final, 31 a 38 do Decreto-lei 70/66, prevê no Artigo 27 do referido diploma legal um procedimento extrajudicial de execução da garantia, com a vantagem de tratar-se de legislação posterior a Constituição Federal de 1988, o que afasta in tese a discussão sobre a constitucionalidade deste procedimento (a análise sobre a compatibilidade ou não dos dispositivos legais que autorizam a execução extrajudicial de dívidas hipotecárias, dispostos no Decreto-lei 70/66, com a Constituição Federal, está sendo analisada no julgamento de dois Recursos Extraordinário (REs 556520 e 627106), sendo que um deles (RE 627106) teve Repercussão Geral reconhecida).
Com o procedimento extrajudicial previsto no Artigo 27 da Lei 9.514/97, a efetivação do direito do credor será muito mais breve se comparado a execução judicial da hipoteca ou mesmo a extrajudicial prevista no Decreto-lei 70/66, ainda pendente de julgamento de constitucionalidade, o que fará o a cobrança do débito muito mais eficaz.
A eficiência da cobrança dos débitos deve ser uma premissa do legislador brasileiro e uma premissa do aplicador da lei, pois este índice de eficiência influencia na economia, sendo fator para a concessão de crédito e elemento que compõe o cálculo da taxa de juros e, em aspectos internacionais, tem influência no chamado “Risco Brasil”, em aspectos jurídicos determina a segurança jurídica dos contratos e da confiabilidade no Poder Judiciário.
Por estas razões muito bem andou o legislador em resgatar esta forma extrajudicial de execução da garantia, atualizando-a e reintroduzindo-a no nosso sistema legislativo para maior eficácia do instituto da alienação fiduciária enquanto garantia real, pois talvez no passado o procedimento executivo extrajudicial previsto no Decreto-lei 70/66, não tinha a realidade fática presente como suporte, tendo o futuro quiça elegido este procedimento como de vanguarda.
A sociedade espera do Estado eficiência e celeridade na prestação da tutela jurisdicional e o Judiciário atualmente se mostra sobrecarregado moroso e incapaz de atender estes anseios da sociedade, e soluções como Lei 9.514/97, do Decreto-lei 70/66, do Inventário, Partilha, Separação e Divorcio extra-judiciais, mostram um caminho a ser seguido, sem falar na Lei de Arbitragem.
“Uma outra vantagem da alienação fiduciária frente a hipoteca está no fato de que o credor fiduciário, no caso de falência do devedor, não corre o risco de perder o imóvel objeto da garantia.
A alienação fiduciária importa na transferência da propriedade resolúvel do imóvel ao credor.
Desse modo, se o devedor falir durante a vigência do contrato, o imóvel não será arrecadado pela massa falida. Nesse caso, o imóvel já não faz parte do patrimônio do devedor.
Como o credor tem apenas a propriedade resolúvel e em caráter fiduciário daquele imóvel, o bem fica também em patrimônio separado do credor.”
Com todo fato posto em observação, as vantagens e desvantagens dependem da perspectiva e do sujeito que a observa, apesar se parecer ser simplório dizer que as desvantagens do instituto sob análise para o credor serão vantagens para o devedor e nesta afirmativa afasta-se toda e qualquer interpretação que possa sugerir manobras de improbidade processual, temos que esta afirmativa e em parte verdadeira, se pensarmos que a perda da propriedade inviabiliza ao devedor de lançar mão de alternativas plenamente legais no instituto de satisfazer o débito que o imóvel está a garantir, diga-se, vender o imóvel, ofertá-lo em segunda hipoteca para angariar crédito.
Outrossim, com tudo o que se disse alhures não se está a afirmar que a hipoteca deixou de ser eficaz como direito de garantia real, até porque existem 05 (cinco) modalidade de hipoteca em nosso ordenamento jurídico, sendo que destas 03 (três) modalidades (hipoteca legal, judiciária e especiais) a alienação fiduciária sobre imóvel não a substitui ou se apresenta como alternativa.
Finalmente, entendo que decisões como as citadas no texto “A hipoteca e bem de família: a garantia sobrevive incólume aos novos princípios?”, REsp 302.186/RJ e REsp 302.281/RJ e a Súmula 308 do STJ, que mitigando o princípio da pacta sunt servanda retiram a força da hipoteca desconstituindo-a com garantia real e reduzindo a zero sua eficácia em nada contribuem para a segurança jurídica das relações contratuais, pois se o vício de consentimento existe é o ato que deve ser anulado (o contrato) e não a hipoteca que merece ser desprezada enquanto instituto do direito civil, pois não é mitigando os institutos do direito civil que se trará segurança e eficácia jurídica, mais sim fortalecendo-os, se o contrato é nulo por vício de consentimento que se anule o contrato e não se desprestigie o instituto da hipoteca.
São decisões como as acima citadas que retiram da hipoteca a segurança que dela se espera, pois mitigando a força dos contratos o Judiciário, pode alijar do credor de sua garantia o que não se verifica com a alienação fiduciária, pois a premissa é que a propriedade é do credor embora de forma resolúvel, o que torna a alienação fiduciária uma garantia mais segura, segurança que deriva da eficiência deste instituto e da posição do Judiciário em relação a alienação fiduciária de imóvel.
Por tudo o que foi dito, apresento como alternativa a hipoteca a alienação fiduciária sobre imóvel, por entendê-la mais atual e eficaz que a hipoteca, que apesar de ainda ter lugar no direito brasileiro, teve a eficácia de sua aplicação em muitos casos superada pela alienação fiduciária sobre imóvel.
Referências bibliográficas
A hipoteca e bem de família: a garantia sobrevive incólume aos novos princípios?,
Disponível em <http://moodle.fgv.br/>, Acesso em: 16 mar.2013
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário analisa constitucionalidade de execução extrajudicial de dívida hipotecária, <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=186899&caixaB
usca=N>. Acesso em: 15 mar.2013.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código civil.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 16 mar. 2013.
BRASIL. Lei nº 9.514/97, de 20 de novembro de 1997. Dispõe sobre o Sistema de
7
Financiamento Imobiliário, institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9514.htm>. Acesso em: 17 mar. 2013.
BRASIL. Decreto-lei nº 70, de 21 de novembro de 1966. Autoriza o funcionamento de associações de poupança e empréstimo, institui a cédula hipotecária e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decretolei/del0070-66.htm>. Acesso em: 17 de mar. 2013.
SÃO PAULO. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004314-36.2011.4.03.6126/SP, Disponível em: <http://web.trf3.jus.br/acordaos/Acordao/BuscarDocumentoGedpro/2448994>. Acesso em: 16 de mar. 2013.
SÃO PAULO. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001861-68.2011.4.03.6126/SP, Disponível em: <http://web.trf3.jus.br/acordaos/Acordao/BuscarDocumentoGedpro/2554288>. Acesso em: 16 de mar. 2013.